Roberto Padovani
Julho 2022
O comportamento dos juros de mercado nos Estados Unidos têm explicado, em geral, o desempenho doméstico de ativos como juros, bolsa e câmbio. E, justamente por isso, antecipar seus movimentos passou a ser algo importante na análise da economia global e na definição das estratégias de investimento.
Historicamente, os juros longos norte-americanos acompanham o nível da taxa básica dos ciclos de aperto monetário. Neste caso, o modo como o Federal Reserve reage aos cenários econômicos globais é um bom guia para os mercados financeiros domésticos.
Taxa de juros: o que esperar?
Uma regra tradicional para entender como o banco central norte-americano irá calibrar a taxa básica é avaliar os juros em relação ao seu nível de equilíbrio e aos desvios de crescimento e inflação.
Em situações como a atual, em que a inflação oscila em patamares mais elevados que a meta e o PIB opera acima de seu potencial, seria razoável supor que os juros deveriam também estar acima de seu nível de equilíbrio de longo prazo.
A intensidade desta alta, no entanto, é uma dúvida.
O movimento recente dos mercados indica que os investidores não acreditam que elevações significativas dos juros básicos sejam necessárias. De fato, os juros de 10 anos têm oscilado ao redor de 3,0%.
A favor desta leitura há o argumento de que os juros neutros são mais baixos hoje e, por isso, é preciso um menor esforço monetário da economia global para desacelerar a atividade e controlar a inflação. A reação do Federal Reserve às últimas experiências de pleno emprego reforça esta tese.
Enquanto em 2000 a taxa básica alcançou 6,5%, houve menor necessidade de aperto em 2005, com a taxa subindo para 5,25% e, no último ciclo de alta, em 2018, a taxa básica alcançou 2,25%.
Além disso, o mercado imobiliário e os indicadores que antecipam o comportamento do PIB já mostram perda de fôlego.
Essa acomodação da atividade vem na esteira não apenas de uma piora das condições de renda gerada pela própria inflação, mas, sobretudo, pela deterioração das condições financeiras, como mostra a queda das bolsas e a consequente destruição de riqueza.
Inflação: um cenário desfavorável
Se do lado do excesso de crescimento já há um ajuste em curso, do lado da inflação a situação permanece complicada.
Enquanto em 2000 a inflação ao consumidor alcançou 3,5%, em 2007 a taxa rodava no patamar de 4,0% e, em 2018, caminhava para 3,0%. Neste momento, o CPI alcançou surpreendentes 8,5%, nível mais elevado em 40 anos.
Além dos níveis inflacionários, as incertezas seguem elevadas. Os desequilíbrios na logística e nas cadeias de produção persistem e a inflação se mostra disseminada, fazendo com que seu controle não dependa apenas da dissipação dos choques de oferta, mas também de um forte ajuste da demanda.
Com o desvio da inflação ainda muito elevado, faz sentido supor que o desaquecimento da atividade deva ser ainda maior, o que pode ser alcançado com mais pressão nos juros básicos e de longo prazo.
E, para complicar mais o quadro, a redução do balanço do Federal Reserve deverá produzir impactos na economia global e nos mercados de títulos, reforçando a alta dos juros de mercado.
Impactos na economia global: previsões finais
Os impactos da retirada de estímulos monetários nos Estados Unidos sobre os preços de ativos locais são claros: o encarecimento do crédito, em conjunto com a guerra na Europa e os novos confinamentos na China, atua no sentido de desacelerar a economia global.
Com uma expectativa de menor demanda, os preços de matérias primas já mostram queda, mesmo com as atuais restrições de oferta. Neste ambiente de menor crescimento, o risco financeiro sobe e inibe os fluxos de capitais para os mercados emergentes.
Todos estes fatores implicam pressão sobre bolsa, juros e moeda.
Portanto, mesmo sem considerar os riscos políticos e fiscais domésticos, a alta dos juros em curso nos Estados Unidos deverá manter os mercados locais instáveis, como foi o padrão no primeiro semestre do ano.